Eu sabia que
não podia passar por aquele caminho... Metade dessa escola não pertencia a nós.
A parte proibida era frequentada por criaturas que só víamos de longe e
ouvíamos falar. Para mim, pareciam humanos comuns...
A divisão era
clara até aos olhos. Tínhamos um diretor e um vice para cada lado. Algumas
histórias falavam sobre as poucas pessoas que quebraram a maior regra da
instituição e atravessaram o limite... Histórias onde não se há nomes, que são
passadas de boca em boca a cada nova turma que entra aqui. Eu estou nessa
escola já faz quatro anos e não conheci nenhum humano que tivesse ultrapassado
a barreira. Mas lembro que no começo do segundo ano um garoto do outro lado
veio pra cá durante a noite. Ninguém sabe o por quê e nem o que aconteceu, pelo
menos não na nossa parte da escola... Não posso responder pelo lado de lá. Só o
que se sabe é que esse garoto nunca mais foi visto na escola.
Íamos pra casa
nas férias. Todos adoravam esse período com os pais depois de tempos rígidos e
estudos puxados. Eu passava esse tempo com meus tios... Não conheci meus pais e
o pouco que um dia meus tios me disseram foi que morreram num acidente muito
grave quando eu era bem pequena e minha tia me trouxe até sua casa. Eles me
criaram e cuidam de mim desde então. Às vezes paro para pensar se foi isso
mesmo. Sempre sinto como se me escondessem algo.
Depois das
aulas de francês e ética, era hora de ir para os dormitórios naquele dia. O
pôr-do-sol pintava o céu de um alaranjado sóbrio e nostálgico, igual a muitas
noites nesse lugar. Essa escola era muito antiga, com normas anciãs... Tudo aqui
intimidava sem menor esforço qualquer aluno. Pairava por todo o lugar um ar um
pouco sombrio que eu sempre acreditei ser culpa apenas das “pessoas” do outro
lado. E também porque segredos demais sempre contagiam nossas sensações...
O sinal tocou. Ninguém gostava daquele som,
afinal, ele ditava outra das regras principais daqui: o toque de recolher. O
barulho ecoava um pouco depois que ele parava, mas era um sinal comum... E
depois de um tempo todos se acostumam com essa regra sem mais questionamentos. Fui
para minha cama, na parte de cima do beliche. Fiquei deitada, olhando para o
teto, pensando sobre como seria o próximo dia. Seria, finalmente, o começo das
nossas tão merecidas férias... Se isso não tivesse acontecido...
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